quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Sobre ter filhos...

“Eu não quero ter filhos”, falei.
“Por que isso agora?”, foi a resposta que obtive.

Como dizer que os tempos não são mais os mesmos, sem parecer uma idosa? Sem parecer que minha idade mental é muito avançada em relação à minha idade verdadeira? Porque eu posso até ter uma idade mental meio avançada, mas eu gosto de ser infantil às vezes. Como dizer que eu tenho medo de que meus filhos se tornem o tipo de pessoa por quem não sinto nada além de pena e desprezo?

“Um dia desse, vi uns meninos chamando uma menina de porca só porque ela era gordinha.”, devaneei.
“Coisa da idade, normal....”, ouvi de volta.
“É normal ser zoado só porque você é diferente?”
“Sim... É coisa de criança e adolescente fazer isso.”

Então, como continuar dizendo que eu não queria que meus filhos fossem fruto de uma sociedade capitalista, cheia de futilidades, onde uma pessoa sofre por não seguir os padrões impostos por ela?
“Você agora é socialista?”, o comentário veio com um tom de deboche.
“Não... A questão não é a economia.”
“E o que é, então?”
“Se Marx tiver razão?”
“Quanto a quê?”
“Toda aquela coisa de ‘O homem é produto do meio’...”
“Agora você virou filósofa?”, o tom de deboche seguido de uma risada sarcástica foi como um tapa na cara.
“Sei lá... Não quero que eles sejam minhas cópias, nem sejam o que a sociedade quer que eles sejam... Mas também não quero que eles sofram por serem diferentes.”
“Você é muito revoltada!”

Percebi que não tinha como discutir. Não importava se eu argumentasse que não quero que meus filhos sofram porque eles são diferentes. Ou que eles sofram porque são iguais demais. Que eu quero que eles sejam, sim, diferentes. E que se orgulhem de sua individualidade. Que eles tenham opiniões próprias, e não só repitam o discurso implantado pela mídia, como meras ovelhas. Que, não importa se o mundo diga que eles estão errados em serem diferentes, eu amo o que é diferente, e as pessoas deviam amar o que é diferente também. Ser diferente é tão aceitável quanto seguir os padrões da sociedade... Ou, pelo menos, devia ser.

Que eles leiam livros e assistam bons filmes! Mas que, se quiserem assistir ao jornal ou à novela, está tudo bem, desde que eles sejam felizes. Que eles podem fazer dieta, se é o que eles querem... Se eles querem se sentir saudáveis e felizes com os corpos que eles têm. Mas não porque disseram para eles mudarem.

Quero que eles saibam que uma pessoa não é feliz pela quantidade de bolsas, sapatos e objetos que ela tem, que as marcas são só jogos de marketing para gastarmos com produtos desnecessários, que pensamos ser cruciais. Mas que, apesar disso, está tudo bem em ter bolsas e coisas da moda. No entanto, não é certo que a felicidade deles dependa disso.

Que o tão desejado status é algo passageiro, e que não se deve deixar de sair com pessoas que te fazem bem porque elas não tem status. Ou que desprezar alguém por sua opção sexual é tão imbecil e inútil que ninguém deveria se dar ao trabalho de fazer isso.

E se meu filho quiser brincar de Barbie, e minha filha, de carrinho? E se minha filha quiser um quarto azul e usar cueca, e meu filho quiser usar um vestido, mesmo que só de brincadeira? Devo proibi-los, só porque a sociedade manda? Devo aceitar calada quando fizerem piadas a respeito disso? Até onde os efeitos do mundo, das pessoas não vai mudá-los? Até que ponto eles não vão sentir vergonha de quem são? Até que ponto eles estarão protegidos do sofrimento causado por serem diferentes? Como fazê-los se sentir bem e felizes com quem eles são se, apesar dos meus esforços, outros destroem tudo?

Por que alguns pais dizem que vão mandar os filhos para a terapia quando eles “saem do armário”? Devo dizer a eles que eles não podem ter amigos homossexuais? E por que as pessoas acham que só porque você tem um amigo homossexual, você também é? Só porque você é menina e tem uma amiga lésbica, você não precisa ser também. E também não significa que ela queira ficar com você. Talvez você nem faça o tipo dela! E, mesmo que faça... Ela pode não estar apaixonada por você, pode não querer estragar a amizade... Assim como acontece numa amizade entre menino e menina. E, algumas vezes, quem se impede de ter uma amizade com uma pessoa assim, está perdendo uma GRANDE amizade. Porque amizade boa é aquela que, apesar das diferenças, vocês se entendem, e que não importa cor, raça, sexo, opção sexual... nada, porque o verdadeiro amigo, aquele que vale a pena conservar, é quem estará com você nos bons momentos, e estará pronto para te apoiar nos difíceis. Aquele que não vai te julgar nem te prejudicar. Poucas amizades são assim, nos dias de hoje. Mas elas ainda existem.

E O MAIS IMPORTANTE, para quê perder tempo criando e espalhando boatos só para prejudicar as outras pessoas? Isso é insegurança, para só conseguir se sentir bem consigo mesmo, ao causar mal ao outro? Ao diminuir o outro, para parecer maior? Que as pessoas se dediquem mais a bons livros e filmes, que se preocupem mais com o crescimento pessoal deles, que percebam que ninguém é melhor que ninguém, mas que uma pessoa pode sempre melhorar. E, se meus filhos forem vítimas disso? E, pior, se eles se tornarem os agentes, apesar de todas as minhas tentativas de dar-lhes uma boa educação?

É por causa de tantos medos, tanta ideologia, insegurança e pouco hedonismo, que transformo tantas dúvidas em uma certeza:

“Não quero ter filhos, só isso.”