quarta-feira, 25 de setembro de 2013

"Uma vez, no abrigo de idosos..."

Num dia de verão, eu conheci um senhor. 
Ele estava esperando para que eu lesse para ele.
Ele tinha 86 anos, seu nome era Wilf.
"Você me lembra uma antiga amiga.", ele disse.
"Uma amiga ou um amor?", perguntei.
"Os dois... Ela era minha amiga antes de se tornar meu amor e minha namorada."
E, com toda a curiosidade do meu ser, eu queria saber mais.
"O que aconteceu com ela?"
"Ela foi embora.", ele disse simplesmente.
Esperei ele falar de novo.
"Nos apaixonamos... Por outras pessoas."
"Sinto muito."
"Não sinta... Ela era minha melhor amiga, e era minha namorada, mas encontramos outras pessoas. É o normal da vida."
"Você não sente saudades dela?", quis saber.
"Muito."
"Sinto muito.", falei mais uma vez.
"De novo... Não sinta. Pessoas vão embora, pessoas morrem o tempo todo, você precisa ter isso em mente."
"Mas..."
"Você tem suas lembranças.", ele me interrompeu. "Algumas vezes, você sente a diversão, e os momentos que você teve com aquela pessoa, e não saudade da pessoa. Mas a gente confunde isso... E ninguém percebe que precisamos deixar as pessoas saírem da sua vida, assim como precisamos que elas deixem que a gente saia da delas... Pessoas vem e vão, entram e saem da sua vida o tempo todo, se acostume, e não fique triste... Fique feliz porque elas estiveram com você em algum momento. Lembre que você pode perder alguém, mas uma pessoa nova vai entrar na sua vida. Aprenda a deixá-las irem, aprenda a libertar.", e eu tinha certeza de que ele era o homem mais sábio que eu já conheci na minha vida.
Ele se tornou meu melhor amigo, e eu me tornei a dele.
Mas numa noite de inverno, ele me deixou.
E eu tive que deixá-lo ir.
Ele tinha 90 anos, e eu, 25. 
E doeu... Doeu muito.
Mas o tempo me ajudou, e eu o deixei ir.
Mas nunca o esqueci, ele era como meu avô, e eu era como sua neta, e foi assim que nos amamos.
Como avô e neta.

Agora, entro num quarto com um livro em minhas mãos, um livro que ele me deu, com as memórias daquele velho na minha mente.
As lágrimas não estão vindo, elas cessaram há muito.
Mas um sentimento bom aquece meu coração sempre que lembro dele.
"O que você vai ler para mim?", a senhora com uma carinha amigável me pergunta.
"Um clássico, você vai amar, prometo.", digo sorrindo.
"Então vamos logo com isso.", ela diz me dando um sorriso gentil.
"Vamos.", eu falo, sentando e abrindo o livro.
"Você não era amiga de Wilf?", ela me pergunta.
"Sim...", respondo.

Eu sei o que está por vir. Eu sei que vou me apegar a ela, e sei que vou perdê-la um dia... Porque é isso o que a vida faz com você.
Mas eu não me importo.
Não vou evitar as pessoas, não vou deixar de ser amiga dela por causa disso. 
Algum dia, eu vou ter que deixá-la ir também, eu sei. Mas isso não vai me parar.
Mais uma vez, eu lembro do sorriso de Wilf, quando ele me contava uma piada.
Sorrio e começo a ler o livro.
Ele estaria orgulhoso de mim.