Uma manhã chuvosa, o céu nublado... Uma felicidade natural,
um bom humor causado pelo tempo fechado, uma satisfação derivada de um
contraste. A manhã estava boa demais para sair de casa e me aborrecer com os
imprevistos do dia-a-dia. Desmarquei todos os meus compromissos, e não me dei
ao trabalho de trocar de roupa: fiquei de pijama, enrolada num edredom. Uma
xícara de chá e, para completar o cenário, uma máquina de escrever me
encarando, sua página em branco esperando para ser escrita.
Qual seria meu tema dessa vez? Um romance? Uma comédia? Uma
breve história de suspense, talvez? A melhor coisa era saber que uma faísca de
ideia poderia levar a um universo totalmente novo. Ou a uma história que já foi
contada muitas vezes... Uma história tão usada que, se fosse uma imagem, seria
um chinelo tão gasto que já está com buracos. Ou aquele livro tão velho e tão
surrado, com páginas amareladas pelo tempo e folhas amassadas por uma chuva
qualquer. Ou uma fotografia de um casal, amassada e jogada no lixo num momento
de raiva, mas retirada de lá, no momento da reconciliação.
No final, algumas histórias são releituras de outras,
contadas com outras palavras, mas sob a visão de outra pessoa. Como pessoas
trocando de roupas: a essência é a mesma, cheias de sentimentos, sofrimentos e
alegrias, impressões boas e impressões más, só o exterior que acaba sendo
diferente, os corpos e as roupas.
Deixei que meus dedos corressem pelas teclas, meio prestando
atenção ao que escrevia, mas ao mesmo tempo pensando nas próximas palavras que
deveriam vir. Sempre que sento para escrever, é como uma grande aventura,
começo sempre com uma folha em branco e uma máquina de escrever, mas nunca sei
onde vou terminar.
O telefone tocou, não dei importância. Continuei a escrever.
Escrevi até meus dedos doerem.
Escrevi até perder o fôlego por prender a respiração, no
frenesi de escrever alguma cena importante.
Escrevi até o papel acabar.
Escrevi sobre uma menina que acordou um dia, com uma
epifania de vida e decidiu seguir seus sonhos. Fiz uma bolinha de papel e a
atirei no lixo perto de mim.
Escrevi sobre vampiros, lobisomens, extraterrestres, sobre
seres incríveis que habitavam um mundo desconhecido, totalmente novo e único,
onde tigres tocavam violoncelo e peixes usavam roupas retrô de mergulho.
Joguei tudo no lixo.
Nada prestou, nada me interessou.
Tentei um serial killer, um canibal e um ladrão de banco.
Todos no lixo.
Tentei deuses gregos, romanos e nórdicos.
Também foram parar no lixo.
Nada prestou, nada me interessou.
Acabei por me desconcentrar e andei pela casa.
Em certo momento do dia, quando não se está fazendo nada,
você começa a esperar que algo aconteça, algo que tire do tédio, ou algo que te
dê inspiração para criar alguma coisa nova e interessante.
Esperei pelo correio e fui ler minhas cartas. Só recebi
contas... Ninguém mais manda cartas hoje em dia.
Esperei por alguma surpresa... Flores, talvez. Mas as flores
não foram enviadas para mim. Se foram, ficaram perdidas juntamente com o
entregador, que não sabia meu endereço.
Esperei por paciência, e por vontade de fazer alguma coisa,
mas eu não conseguia parar mais de um minuto e fazer uma coisa só.
Nada.
O dia se passou desse jeito, sem produtividade alguma.
Foi quando percebi que minha folha deveria ser preenchida
com uma pequena reclamação...
Um lembrete, para colocar na porta da geladeira, num quadro,
para transformar meu lembrete em arte, ou para tirar uma foto e usar como wallpaper do celular:
“Todos os dias, tudo
pode acontecer... Inclusive nada.”
PPS: Atendendo a pedidos, o "Na falta de uma ideia melhor" agora tem uma página no FB, então quem ainda não curtiu e se interessar, por favor, be my guest! https://www.facebook.com/nafaltadeumaideiamelhor
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PS: Meus mais sinceros agradecimentos ao amigo Lucas Medeiros, que permitiu que eu usasse um dos desenhos dele para ilustrar um dos meus textos!
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